Coletivo Nacional de Advogados de Servidores Públicos (CNASP) vem a público manifestar seu repúdio à decisão do Presidente da República, Michel Temer, de disponibilizar o uso das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) para operações de “inspeção rotineira” nos presídios estaduais. As ações a serem promovidas serão controladas pelo Ministério da Defesa, mediante concordância dos governos dos estados da Federação, com o propósito de “restaurar a normalidade e os padrões básicos de segurança dos estabelecimentos carcerários brasileiros”1. A intervenção das forças armadas nos presídios é medida que não se coaduna com as funções institucionais que lhes confere a Constituição Federal, configurando grave desvio de finalidade. Mesmo o seu uso para a “garantia da lei e da ordem” (parte final do caput do art. 142 da Constituição Federal) deve se restringir às excepcionais hipóteses de decretação de estado de defesa ou de estado de sítio. No caso específico da crise do sistema prisional, a onda de violência assistida nas primeiras semanas deste ano, antes de ser uma “questão de segurança nacional”, é o desfecho de uma longa trajetória de descompromisso do Estado Brasileiro com qualquer propósito de reabilitação social dos apenados e de inobservância do devido processo legal. Em especial no acompanhamento do cumprimento de pena pelos presos definitivos e das condições de manutenção do aprisionamento dos detentos provisórios2. Nesse contexto, o uso das Forças Armadas apenas reflete a insistência do Estado em uma política criminal e carcerária fracassada, bem como reafirma o etiquetamento do apenado com o status de não-cidadão e inimigo público, justificando a sua condição de não-sujeito de direitos e garantias fundamentais, o que só vem em prejuízo de toda a sociedade que se pretende democrática.
Foto: Valter Campanato/ Agência Brasil
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1 Informações apresentadas em coletiva de imprensa do senhor Porta-voz da Presidência da República, Alexandre Parola. Fonte: Portal Planalto. http://www2.planalto.gov.br/acompanhe-planalto/noticias/2017/01/temer-oferece-forcas-armadas-para-acoes-em-presidios-nos-estados. Publicado em 17-01-2017. Acessado em 19-01-2017.
2 O relatório mais atualizado do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), relativo a dezembro de 2014 e divulgado em abril de 2016, informa que o Brasil contava, naquela data, com a quarta maior população carcerária do mundo (622.202 pessoas), na qual 40% compreendia detentos provisórios, muitos dos quais sequer tiveram condenação em primeiro grau de jurisdição. E, no que diz respeito à natureza dos crimes pelos quais estavam presos, 28% dos detentos respondiam ou foram condenados por tráfico de drogas. Fonte: http://www.justica.gov.br/noticias/populacao-carceraria-brasileira-chega-a-mais-de-622-mil-detentos. Acessado em 20-01-2017.